novembro de 2015
AFRO HOOLIGANS
Akin Deckard
fotos MANDELACREW
Na ordem natural do cosmos, existem pontos de equilíbrio indivisíveis e alicerces gravitacionais invisíveis, agindo sobre tudo aquilo que aqui reside.
Se pensarmos na definição de música como um universo, o Afro Hooligans seria uma galáxia em particular. De estrutura mórfica em constante expansão, sua sonoridade orbita no campo da música eletroacústica, seguindo por uma via de duas mãos entre o concreto e o abstrato.
Tendo em sua formação Marcos Felinto, Everton Andrade e Guilherme Henrique, o trio mascarado de múltiplas faces parece pertencer ao tudo e nada em simbiose. Sua sonoridade percorre direções opositivas em uma constante, onde o “inclassificável” lhes cai bem.
Minha comparação do trabalho do Hooligans à uma galáxia não se faz ao acaso. Se reunirmos seu material de registro, disponível em forma de EP’s, singles e vídeo-histórias, fica quase impossível achar um termo definitivo para enquadrá-los, assim como a matéria escura encontrada no centro das galáxias. Suas apresentações, um misto de ritual com performance, ocultismo, simbolismo, ruidagem, colagens, dissonância e repetição-não-sequenciada, nos traga para dentro de um buraco negro sem aviso. O caminho por onde somos guiados é imprevisível e, inevitavelmente, transformador. É música pra se sentir nos ossos.
Seus alicerces são as infinitas influências que os integrantes carregam na bagagem — da eletrônica ao afropunk, do gótico ao industrial, do noise ao metal — fazendo da relação telecinética entre o trio e seus respectivos instrumentos uma indivisível e inexplicável força gravitacional.
Comumente portando garrafas de vinho à mão, como numa ciranda de embriaguês dos sentidos, poucas palavras se ouvem dos hooligans em performance. Sua conexão é extra-corpórea, uma teoria do caos em tempo real, onde cada membro representa uma massa de átomos em movimento, prontos para colidir em som, suor e fúria. De vestes que lhes cobrem o corpo por inteiro, são vistos como “eletrônicos demais para o metal instrumental” e “metaleiros demais para a eletrônica”, fazendo música híbrida gutural fora do esquadro.
Assistir ao Afro Hooligans ao vivo é se tornar parte de uma hecatombe xamânica da nossa percepção musical. Tudo aquilo que sabemos sobre ritmo e estrutura de composição parece ser descartável demais a eles, e por tal, deve ser banido de imediato, a fim de confundir os ouvidos para esclarecer. Na linguagem tradicional de músicos e artistas contemporâneos, a produção do grupo se desenvolve no formato de “jam session”; ato de composição e improvisação espontânea com elementos sonoros manipulados e arranjados em tempo real.
Considerando o vasto uso que fazem de equipamentos analógicos, onde fica quase impossível replicar com exatidão cada movimento de botões e pressionar de teclas, seus shows parecem cada vez melhores e mais enérgicos, com temas e canções autorais subvertidos de acordo com a energia das pessoas presentes em cada ato.
Mais preocupados em proporcionar experiências sensoriais a um público tão diverso quanto seus projetos paralelos, é na dualidade entre a expectativa e o acaso que seu trabalho toma forma. Por mais familiar que aquilo que ecoa de seus infinitos pedais, teclados, baterias eletrônicas e sintetizadores possa parecer depois de certo tempo de imersão, a deturpação de nossa percepção e a desconstrução do nosso senso estético é a motriz da expressão artística de Felinto, Andrade e Henrique.
Como recomendação para aqueles que querem adentrar o universo do Afro Hooligans, recomendo respirar fundo e se preparar para uma apinéia sinestésica, tomando fôlego para um mergulho em águas quentes, densas e turvas. Do outro lado desta mística imersão, nunca se sabe o que iremos encontrar, mas uma certeza prevalece: após ouví-los, você não será mais o mesmo.
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UMA MÚSICA QUE DEFINE TUDO
Dissociative Trance Disorder
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DISCOGRAFIA
AFRO HOOLIGANS (2015)
HARD VANILLA (2014)
TINY (2013)
THE RETROFUTURIST (2012)
SAIBA +
afrohooligans.bandcamp.com